BigTechs estão alimentando a crise climática

Sheila Zabeu -

Maio 23, 2022

Pela primeira vez, a Microsoft divulgou métricas de consumo de energia e água de seus data centers, como resposta à discussão na conferência climática global COP26 realizada em novembro de 2021. No evento, foi discutido como a falta de medições confiáveis e consistentes dificulta o progresso no caminho para zerar as emissões de gases de efeito estufa (Net Zero). 

Para superar os desafios presentes na medição das emissões de carbono em suas operações, e tornar a contabilidade das emissões mais confiável e interoperável, a Microsoft – junto com a ClimateWorks Foundation e 20 outras organizações – lançou a iniciativa Carbon Call. Também desenvolveu a plataforma Microsoft Cloud for Sustainability, para fornecer às organizações, em geral, meios mais eficientes de combinar diferentes fontes de dados em um só lugar e ter insights sobre como melhorar as abordagens de sustentabilidade.

O resultado é que agora a Microsoft afirma contar com medições que correspondem à realidade. A empresa acompanhou os números dos data centers em nível global e em nas várias regiões geográficas em que opera – Américas, Ásia-Pacífico e EMEA (Europa, Oriente Médio, África).

Uma das medições usadas tem a ver com eficácia energética (Power Usage Effectiveness – PUE), ou seja, quanto o data center consome de energia em suas operações alimentação, refrigeração, iluminação e processamento de servidores e redes. Quanto mais próximo o número PUE estiver de 1, mais eficiente é o uso de energia. 

O compromisso da Microsoft é inovar continuamente nos projetos e manutenção de seus data centers para chegar o mais próximo possível de 1. No gráfico abaixo, as barras azuis mostram os números de PUE estimados ou projetados, enquanto as barras cinzas os números PUE reais das instalações da Microsoft. Apenas como exemplo, a Microsoft aponta que, na região Ásia-Pacífico, o PUE real é o maior, em parte devido às temperaturas ambientes mais altas que exigem mais resfriamento dos data centers.

Fonte: Microsoft

De forma semelhante, a Microsoft mede a eficácia do uso da água (Water Usage Effectiveness – WUE) nas operações de seus data centers. Assim como acontece com PUE, existem variáveis que podem impactar esse número, muitas relacionadas à localização das instalações. Data centers em partes mais frias do mundo, como Suécia e Finlândia, exigem menos água para resfriamento. O gráfico a seguir mostra em azul os valores de WUE estimados ou projetados e em cinza os valores reais. Novamente, a região Ásia-Pacífico tem o WUE mais alta devido às temperaturas ambientes mais elevados e, consequentemente, a necessidade de usar refrigeração a água em alguns lugares.

Fonte: Microsoft

A Microsoft destaca que continua adotando tecnologias para reduzir o uso de água, como as usadas no data center em Phoenix (Arizona, EUA), onde ar externo é utilizado na maior parte do ano para resfriar os servidores. Também faz a refrigeração usando evaporação direta, que requer uma fração da água em comparação com outros sistemas convencionais de resfriamento à base de água. Além disso, ao alimentar o data center com energia solar do projeto Sun Streams 2, substitui-se a água usada no processo tradicional de geração de energia, buscando economizar 356 milhões de litros anualmente.

Em março passado, a Microsoft também compartilhou seu relatório anual de sustentabilidade, em que reporta avanços nas emissões de Escopo 1 e Escopo 2, com redução de cerca de 17% na comparação ano a ano, com base na aquisição de energia renovável. No entanto, a empresa registrou um aumento de 23% nas emissões de Escopo 3 no mesmo período. As emissões de Escopo 3 representam o total de emissões em toda a cadeia de valor da empresa. A empresa comenta que está trabalhando com parceiros do setor, entre eles a Infrastructure Masons, para elevar a transparência de dados sobre emissões de carbono na cadeia de suprimentos de data centers.

Há controvérsias

Ainda que seja relevante empresas do porte da Microsoft divulgarem dados de sustentabilidade de seus data centers e procurem reduzir suas emissões, o dinheiro que as grandes players de tecnologia têm no banco põe a perder todos esse esforços.

Quem faz essa afirmação é o relatório “The Carbon Bankroll: The Climate Impact and Untapped Power of Corporate Cash” que fornece uma análise do impacto climático oculto das finanças de grandes companhias para que seja possível entender a escala das emissões geradas pelo caixa, investimentos e práticas financeiras das empresas.

O estudo foi publicado conjuntamente pelos grupos ambientais Climate Safe Lending Network (CSLN), The Outdoor Policy Outfit (TOPO) e BankFWD. Esse consórcio examinou as demonstrações financeiras corporativas das Big Techs para descobrir quanto dinheiro tinham em mãos e, em seguida, calculou quanto carbono cada dólar pode ter gerado de impacto ambiental. Conclui que para várias empresas, incluindo Microsoft, Google, Meta e PayPal, as emissões geradas por seus investimentos e dinheiro excedem todas as outras emissões combinadas.

De acordo com os cálculos do consórcio, as emissões de carbono do Google, na verdade, teriam aumentado cento e onze por cento da noite para o dia. As emissões da Meta teriam aumentado cento e doze por cento, e as da Apple, sessenta e quatro por cento. No caso específico da Microsoft, em 2021, as emissões geradas pelos US$ 130 bilhões que a empresa tinha em caixa e mais os seus investimentos seriam comparáveis às emissões cumulativas geradas pelas operações de manufatura, transporte e uso de todos os produtos da empresa no mundo.

Fonte: Carbon Bankroll

Para a Amazon, em 2020, o total de US$ 81 bilhões mantido em dinheiro e investimentos de curto prazo gerou mais emissões do que a energia comprada para alimentar todas as instalações empresa no mundo, incluindo data centers, centros de atendimento, lojas físicas e outras instalações.

Em geral, para grandes empresas do mundo as reservas de caixa são a maior fonte de emissões, aumentando o volume total das emissões entre 91% a 112% em comparação com o relatado mais recentemente. Para empresas com operações que resultam em emissões mais intensas de carbono, as reservas de caixa constituem uma das maiores fontes de emissões, aumentando as emissões totais entre 11% e 15% em comparação com as emissões relatadas mais recentemente.

Fonte: Carbon Bankroll

O estudo “The Carbon Bankroll” sugere que, assim como as empresas trabalham para descarbonizar suas cadeias de suprimentos operacionais e de energia, elas podem contribuir para descarbonizar suas cadeias financeiras, pressionando os bancos a reduzir o financiamento de combustíveis fósseis. Ao fazer isso, ajudariam a atingir suas metas climáticas corporativas e também a melhorar o desempenho climático do setor financeiro.